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Archive for 26/07/2011

De Comandante do Ataque a Pearl Harbor a Cidadão Americano

“Desejamos que o senhor comande a nossa força aérea, na hipótese de atacarmos Pearl Harbor”.

Fiquei quase sem fôlego. Eram fins de setembro de 1941 e, se a situação internacional continuasse a agravar-se, o plano de ataque teria de ser executado em dezembro. Não havia tempo a perder para essa importantíssima missão.

Em meados de novembro, após o mais rigoroso treinamento, foram levados os aviões para bordo dos respectivos porta-aviões que, a seguir, aproaram para as ilhas Curilas, viajando isolados e seguindo rotas diferentes para não despertar atenção. Depois, às seis horas da manhã, uma manhã escura e nublada, em 26 de novembro, nossa força-tarefa de 28 navios, incluindo seis porta-aviões, deixou as Curilas.

O Vice-Almirante Nagumo comandava a Força de Ataque a Pearl Harbor. As instruções por ele recebidas, diziam: “No caso de as negociações com os Estados Unidos chegarem a conclusão satisfatória, a força-tarefa retornará imediatamente à pátria”. Desconhecendo o fato, entretanto, as tripulações, lançando o que talvez fosse seu último olhar ao Japão, gritavam: “Banzai!”. Podia-se perceber seu ardente entusiasmo e espírito combativo. Malgrado isso, eu não podia deixar de alimentar dúvidas quanto à confiança com que o Japão se lançava à guerra.

Nossa rota devia passar entre as ilhas Aleutas e a Ilha de Midway, de maneira a ficar fora do alcance de patrulhas aéreas americanas, que, em alguns casos, segundo se supunha, abrangiam uma extensão de 1.000 quilômetros. Enviamos à frente três submarinos para informar da presença de quaisquer navios mercantes, a fim de podermos alterar a rota e evitá-los. Mantínhamos um alerta permanente contra submarinos americanos.

Nossos rádios permaneciam em absoluto silêncio, mas ouvíamos as transmissões de Tóquio e Honolulu procurando alguma palavra sobre o início da guerra. Em Tóquio, uma conferência de coordenação do governo e do Alto Comando esteve em sessão, diariamente, de 27 a 30 de novembro, para discutir a proposta feita pelos EUA no dia 26. Chegou-se à conclusão de que a proposta era um ultimato destinado a subjugar o Japão e a tornar a guerra inevitável, mas que se deveria insistir nos esforços pela paz até o último momento.

A decisão a favor da guerra foi tomada na Conferência Imperial, realizada a 1º de dezembro. No dia seguinte, o Estado-Maior Geral deu a ordem: “O dia do ataque será 8 de dezembro (7 de dezembro no Havaí e nos Estados Unidos)”. A sorte estava lançada: rumamos diretamente para Pearl Harbor.

Por que foi escolhido aquele domingo para o ataque? Porque estávamos informados de que a Esquadra Americana regressava a Pearl Harbor nos fins de semana, após um período de instrução no mar. E também porque o ataque deveria ser coordenado com nossas operações em Malaca, onde estavam previstos ataques e desembarques aéreos para a madrugada naquele dia.

De Tóquio foram-nos retransmitidos relatórios do Serviço de Informações sobre atividades da Esquadra Norte-Americana.

7 de dezembro (6 de dezembro, hora do Havaí): “Não há balões nem redes antitorpedos em torno dos encouraçados fundeados em Pearl Harbor. Todos os encouraçados estão na baía. Não há indicações, na atividade do rádio inimigo, de que estejam sendo feitos vôos de patrulha oceânica na região do Havaí. O Lexington deixou o porto ontem. Supõe-se que o Enterprise também esteja operando”.

Nessa ocasião é que recebemos a mensagem do Almirante Yamamoto: “O apogeu ou declínio do Império depende desta batalha; todos devem dar o máximo de seu esforço no cumprimento do dever”.

Estávamos a 230 milhas do norte de Oahu, onde está situada Pearl Harbor, pouco antes do alvorecer do dia 7 de dezembro (hora do Havaí), quando os porta-aviões manobraram na direção do vento norte. A bandeira de combate tremulava no topo de cada mastro. O mar estava muito agitado, o que nos fez hesitar quanto à decolagem no escuro. Achei que era viável. Os conveses de vôo vibraram com o ronco dos motores dos aviões acabando de aquecer.

Uma lâmpada verde foi agitada em círculos. “Decolar!”. O rugido do motor do primeiro caça foi crescendo até que ele se elevou no ar, são e salvo. Havia grande aclamação cada vez que um avião decolava.

Dentro de 15 minutos, 183 caças, bombardeiros e torpedeiros tinham decolado dos seus porta-aviões e estavam entrando em formação no céu ainda escuro, guiados apenas pelas luzes de sinalizações dos aviões-guia. Após circularmos por cima da esquadra, tomamos a rota sul, para Pearl Harbor. Eram 6:15 h.

Sob meu comando imediato, havia 49 aviões de bombardeiro horizontal. À minha direita, e um pouco abaixo, estavam 40 aviões torpedeiros, à minha esquerda, cerca de 200 metros acima, 51 bombardeiros de mergulho; protegendo a formação, havia 43 caças.

Às 7:00 h calculei que deveríamos chegar à Oahu em menos de uma hora. Mas, voando por cima das espessas nuvens, não víamos a superfície do mar e, portanto, não podíamos controlar nossa deriva. Liguei o radiogoniômetro para a estação de Honolulu e não tardei a ouvir música. Girando a antena, encontrei a direção exata de onde vinha a transmissão, e corrigi nossa rota. Tivéramos uma deriva de cinco graus.

Ouvi então um boletim metereológico de Honolulu: “Nublado em parte, principalmente sobre as montanhas. Boa visibilidade. Vento norte, dez nós”.

Que sorte a nossa! Não se poderia ter imaginado situação mais favorável. Devia haver brechas nas nuvens, sobre a ilha.

Cerca de 7:30 h as nuvens se abriram de repente e apareceu uma longa linha branca de litoral. Estávamos sobre a extremidade norte de Oahu. Era a hora de desdobrarmos a nossa formação.

Chegou um relatório de um dos dois aviões de reconhecimento que tinha ido à frente, dando a localização de dez encouraçados, um cruzador pesado e dez cruzadores leves. O céu ia ficando mais limpo à proporção que avançávamos para o alvo, e comecei a estudar nossos objetivos com auxílio do binóculo. Os navios estavam lá. “Dê ordem de ataque a todos os aviões”, ordenei ao meu rádio-operador. Eram 7:49h.

As primeiras bombas caíram no aeródromo de Hickam, onde havia fileiras de bombardeiros pesados. Os pontos atingidos a seguir foram as ilhas Ford e o aeródromo de Wheeler. Em pouco tempo, imensos rolos de fumaça subiam dessas bases.

Meu grupo de bombardeiro horizontal manteve-se a leste de Oahu, para lá da extremidade sul da ilha. No ar só havia aviões japoneses. Os navios, na baía, pareciam ainda adormecidos. A estação de rádio de Honolulu continuava normalmente sua transmissão. Conseguíramos a surpresa!

Sabendo que o Estado-Maior Geral devia estar ansioso, ordenei que fosse enviada à esquadra a seguinte mensagem: “Conseguimos realizar ataque de surpresa. Peço retransmitir esta informação para Tóquio”.

Começaram a aparecer esguichos de água em torno dos encouraçados. Eram os nossos aviões torpedeiros em ação. Era tempo de desencadearmos nossos bombardeios horizontais. Ordenei ao meu piloto que inclinasse o avião abruptamente. Era o sinal de ataque para o nosso grupo. Os meus dez esquadrões formaram em coluna por um, com intervalos de 200 metros – uma bela formação.

Enquanto meu grupo fazia a corrida para o bombardeio, a artilharia antiaérea americana, tanto de bordo dos navios, como as baterias terrestres, entrou subitamente em ação. Aqui e ali viam-se explosões de cor cinza-escura, até que o céu se encheu de abalos de tiros quase certeiros que faziam nossos aviões estremecer. Fiquei surpreendido com a rapidez do contra-ataque, que veio menos de cinco minutos depois de lançada a primeira bomba. A reação japonesa não teria sido tão pronta – o caráter japonês é apropriado à ofensiva, mas não se ajusta facilmente à defensiva.

Meu esquadrão dirigia-se para o Nevada, que estava fundeado na extremidade norte do cais dos encouraçados, na parte leste da ilha Ford. Estava quase no momento de soltar as bombas quando penetramos numa formação de nuvens. Nosso bombardeador-guia abanou as mãos para trás e para frente para indicar que teríamos que passar em branco, e demos uma volta sobre Honolulu para aguardar outra oportunidade. Nesse ínterim, outros esquadrões fizeram suas corridas, tendo alguns realizados três tentativas antes de lograrem êxito.

Repentinamente, colossal explosão verificou-se no cais dos encouraçados. Uma imensa coluna de fumaça se elevou a uns 300 metros, e uma violenta onda de choque atingiu o nosso avião. Devia ter explodido um paiol de pólvora. O ataque estava no auge; a fumaça dos incêndios e explosões enchia quase todo o céu de Pearl Harbor.

Observando com o binóculo o cais dos encouraçados, vi que a grande explosão havia sido no Arizona. Este continuava ardendo furiosamente, e como a fumaça cobria o Nevada, alvo do meu grupo, procurei algum outro navio para atacar. O Tennessee já estava pegando fogo, mas junto dele encontrava-se o Maryland. Dei ordem para mudar, tomando o Maryland como alvo, e voamos em direção ao fogo antiaéreo.

Quando o bombardeador do nosso avião-guia largou sua bomba, os pilotos observadores e radioperadores dos demais aviões gritaram: “Lançar!” e lá se foram as nossas bombas. Imediatamente me deitei de bruços no chão para observar através de uma fresta. Quatro bombas, formando um desenho perfeitamente simétrico, caíam a prumo como demônios da destruição. Foram diminuindo de tamanho até se transformarem em pontinhos, e finalmente desapareceram, dando lugar a quatro minúsculos clarões no navio e perto dele.

De grande altitude, os tiros perdidos são mais perceptíveis que os impactos diretos, pois produzem ondas circulares na água, fáceis de ver. Percebendo duas dessas ondas e mais dois pequenos clarões, bradei: “Dois certeiros!”. Tive a convicção de que havíamos produzido danos consideráveis. Dei ordens aos bombardeiros que haviam completado suas missões que retornassem aos porta-aviões. O meu, porém, permaneceu sobre Pearl Harbor para observar e dirigir as operações ainda em curso.

Pearl Harbor e arredores estavam convertidos num caos. O Utah havia emborcado. O West Virginia e o Oklahoma, com os cascos quase arrancados pelos torpedos, adernavam perigosamente em meio a uma inundação de óleo grosso. O Arizona estava muito adernado e ardia furiosamente. Os encouraçados Maryland e Tennessee ardiam também. O Pennsylvannia, que estava no dique, ficara intacto – evidentemente o único encouraçado que não fora atacado.

Durante o ataque, muitos dos nossos notaram os valentes esforços dos pilotos americanos para decolar com seus aviões. Apesar da grande inferioridade numérica, voaram diretamente sobre nossos aparelhos para travar combate. Os resultados foram ínfimos, mas sua coragem impôs admiração e respeito.

Os aviões de nosso primeiro ataque levaram uma hora para concluir sua missão. Quando iniciaram o regresso aos porta-aviões, após terem perdido três caças, um bombardeiro de mergulho e cinco aviões torpedeiros, entrou em cena a nossa segunda vaga de 171 aviões.

O céu agora estava tão coberto de nuvens e de fumaça que era difícil localizar os alvos. Para dificultar ainda mais a missão, o fogo da artilharia antiaérea, naval e terrestre tornara-se intensíssimo.

O segundo ataque conseguiu excelente dispersão, atingindo os encouraçados menos danificados, bem como cruzadores, e contratorpedeiros não atingidos anteriormente. Durou também cerca de uma hora, mas, em virtude da intensificação do fogo da defesa, houve novas baixas, seis caças e 14 bombardeiros de mergulho.

Depois que a segunda onda iniciou a viagem de retorno aos porta-aviões, dei novamente uma volta sobre Pearl Harbor para observar e fotografar os resultados. Contei quatro encouraçados positivamente afundados, três seriamente avariados. Outro encouraçado parecia consideravelmente desmantelado, e haviam sido destruídos numerosos navios de outros tipos. A base de hidraviões da ilha Ford estava presa das chamas, bem como os aeródromos, especialmente o de Wheeler.

Densa cortina de fumaça tornava impossível determinar os estragos sofridos pelos aeródromos. Era evidente, todavia, que boa percentagem do poderio aéreo da ilha fora destruído: nas três horas em que meu avião permaneceu naquela região, não encontramos um único avião inimigo. No entanto, vários hangares estavam ilesos, e era possível que alguns deles contivessem aviões utilizáveis.

Meu avião foi talvez o último a voltar para a esquadra, onde outros aparelhos, reabastecidos e rearmados, estavam-se alinhando, preparando-se para outro ataque. Fui chamado sem demora à ponte de comando. O Estado-Maior do Almirante Nagumo, enquanto aguardava meu relatório, estivera entretido em uma discussão intensa sobre a conveniência de lançar novo ataque.

– Quatro encouraçados positivamente afundados – informei. – Alcançamos elevado grau de destruição nas bases aéreas e nos aeródromos. Há, contudo, muitos alvos por atingir.

Insisti por novo ataque. O Almirante Nagumo, porém – numa decisão que desde então tem sido alvo de muita crítica por parte de peritos navais – preferiu voltar à base. Imediatamente foram alçadas as bandeirolas de sinais e nossos navios aproaram para o norte a grande velocidade.

Após a guerra, Fuchida foi interrogado pelo tenente RP Aiken e o tenente James A. Field, Jr., ambos da Reserva Naval dos Estados Unidos, em outubro 1945. Ele forneceu as suas impressões do ataque a Pearl Harbor e das defesas nas Ilhas Mariana e Ilhas Filipinas. Fuchida foi altamente cooperativo durante o interrogatório como observado pelos interrogadores. Ele indicou que os oficiais japoneses só completaram a análise do sucesso Pearl Harbor três dias depois do ataque, mas não repetiram um novo ataque porque foi assumido que os americanos iriam deslocar seus navios para outro lugar, ele foi chamado para prestar depoimento sobre crimes de guerra, inicialmente pensou que os americanos estavam apenas aplicando a “justiça do vencedor”.

Fuchida escreveu o Midway: The Battle that Doomed Japan em 1951, sendo considerado como cânon, pelo mundo ocidental. No entanto, Quebrado Espada de Jonathan Parshall e Tully Anthony expôs e corrigiu uma ampla gama de imprecisões encontradas no livro de Fuchida.

No outono de 1948, perto da estátua de Hachiko na Estação Shibuya, em Tóquio, Japão, Fuchida recebeu um panfleto sobre a vida de Jacob DeShazer, um membro do Ataque Doolittle, que foi capturado pelos japoneses, e mais tarde tornou-se um missionário cristão. Em 1949, perto do mesmo local, ele comprou uma cópia do Novo Testamento da Bíblia. Em maio de 1950, ele conheceu Jacob DeShazer pela primeira vez. Em 1952, ele excursionou pelos Estados Unidos como um membro da World Wide Christian Missionary Army of Sky Pilots, o que seria a primeira de suas muitas excursões ao redor do mundo como um missionário. Ele declarou-se um “embaixador da paz”. Em 1955, ele publicou o livro De Pearl Harbor até o Gólgota, também conhecido como De Pearl Harbor até o Calvário, que se concentrou ainda mais em sua fé do que os assuntos militares, mas era para ser o volume subseqüente de Midway: The Battle that Doomed Japan. Ele se tornou um cidadão americano em 1960.

Fuchida faleceu devido a complicações causadas por diabetes em Kashiwara, Japão.

Fontes:

Mitsuo Fuchida biography

Bruce Gamble, Darkest Hour
Interrogations of Japanese Officials