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“Eu Vi Morrer o Sargento Wolf ” – Relato de Joel Silveira


 Vamos publicar uma série de informações sobre a atuação do Sargento Max Wolf Júnior na Itália, com uma análise sobre o ícone em que se transformou o Sargento herói, que tem sido colocado na galeria dos grandes soldados brasileiros.

Relato de Joel Siveira:

Vi perfeitamente quando a rajada de metralhadora rasgou o peito do Sargento Max Wolf Júnior. Instintivamente ele juntou as mãos sobre o ventre e caiu de bruços. Não se mexeu mais. O tenente que estava do meu lado no posto de observação apertou os dentes com força, mas não disse uma palavra. Quando lhe perguntei se o homem que havia tombado era o Sargento Wolf, ele balançou a cabeça afirmativamente.

Menos de uma hora antes eu estivera conversando com o sargento. Creio que foi a mim que ele fez suas últimas confidências. Falou-me de sua filha, uma menina de 10 anos de idade. Disse-me que era viúvo e deu-me notícias de que a promoção a segundo-tenente, por ato de bravura, não tardaria a chegar. E como eu estava colhendo mensagens de homens do seu “Pelotão de Choque”, já formados para a patrulha de minutos depois, o Sargento Max Wolf pediu-me que também enviasse sua carta. Estão comigo as poucas linhas que sua letra delicada e carta escreveu no meu caderno de notas:

“Aos parentes e amigos. Estou bem. À minha querida filhinha – Papai vai bem e voltará em breve.”

Tenho ainda nos ouvidos, muito vivas, as últimas palavras que escutei do sargento. Um dos soldados pedira uma faca, e ele respondeu, sorrindo:

 – Voi non bisogna faca – Tedesco não é frango.

O sargento saiu com seus homens pela sebes e ravinas da direita e nós seguimos para as montanhas ao Norte, defronte ao ponto que a patrulha deveria atingir. Vimos quando os homes apontaram na “terra de ninguém” e seguiram cautelosos pela estrada deserta. O sargento havia transformado seus pentes de munição num colar que o sol incendiava. Levava o capacete de aço debaixo do braço e a pequena Thompson apontada para a frente. Nossa Artilharia, à esquerda, cessara de atirar e agora o silêncio era total. O tenente me disse:

 – Não é possível que os alemães estejam ali.

O primeiro objetivo da patrulha eram as três casas, a menos de um quilômetro de nós, e que os homens do Sargento Wolf atingiram às duas horas da tarde. O grupo cercou os três edifícios em ruínas e o sargento empurrou com o pé a porta de um deles. Vimos quando ele empurrou com o pé a porta de um deles. Vimos quando ele entrou e fez um sinal para seus homens: novamente as duas fileiras espaçadas voltaram a caminhar pelos campos proibidos. Fazia um sol muito claro e alguma coisa – uma vidraça partida ou um esqueleto de munição – cintilava forte no casario de Montese.

Às duas horas e meia da tarde, a patrulha estava a menos de cem metros do último objetivo a ser atingido: um novo grupo de casas sobre uma lombada macia. O Sargento Wolf deu os últimos passos à frente. Então uma gargalhada curta e nervosa rasgou o silêncio do vale e o sargento caiu de bruços sobre a grama. Os outros homens se agacharam, rápidos, e o alemães começaram a atirar, bloqueando nossos homens com uma chuva de granadas de mãe e rajadas de metralhadoras. Sacudiram depois para o ar foguetes luminosos, pedindo fogo de suas baterias, e minutos depois os projetos de artilharia nazista assoviavam sobre nós e iam explodir no caminho percorrido pela patrulha. O tenente indicou posições aos nossos morteiros e durante mais de uma hora o duelo continuou, um diálogo de fogo. Nossos morteiros rebentaram dois quilômetros e meio além, onde possivelmente estariam localizadas as baterias nazistas, e os obuses alemães explodiam perto, no chão onde nossos homens continuavam agachados ou nas fraldas do morro onde estávamos com o posto de observação. De vez em quando, uma rajada de metralhadora cortava o ar, como um vento mau, e ia inquietar os galhos das árvores próximas. Foi um desses “Leques” que raspou nossas cabeças e nos jogou para dentro do buraco, onde ficamos por uma hora. Levantamos de vez em quando até o parapeito da trincheira, mas os morteiros só nos davam folgas de segundos: escutávamos seu assovio a distância e voltávamos a nos espremer no foxhole antes de a explosão sacudisse a terra.

Quando a noite caiu, conseguimos, rastejando, deixar as posições batidas e alcançar as trincheiras de retaguarda. Chegamos ao PC do Batalhão perto das dezenove horas. Minutos depois, voltaram também os homens da patrulha do Sargento Max Wolf Júnior. Mas ele ficara lá. Quando nossos padioleiros foram à “terra de ninguém” recolher os corpos e os feridos, os nazistas os recebiam com rajadas impiedosas.

Muitos dos que voltaram tinham os olhos rasos de água. Uma deles era o Segundo-Sargento Nilton José Facion, de São José Del-rei, em Minas, que me contou a história:

 – Eu estava a trinta metros de Wolf quando ele foi atingido. O soldado Alfredo Estevão da Silva, que ia na frente, virou-se para mim e disse: “Parece que Wolf está morto. Vou puxar o corpo para cá”. Respondi que ia atrás dele. Mas uma rajada matou também o pracinha Estavão antes que ele pudesse fazer qualquer coisa. Chegou a minha vez e consegui arrastar o corpo do sargento uns trinta metros. Depois veio a chuva de morteiros e não pude fazer mais nada.

O Sargento Alfeu de Paula Oliveira (ele também enxugava os olhos úmidos com a manga da blusa) me levou depois ao estreito compartimento onde Wolf tinhas suas coisas: ali estava a condecoração que o General Truscott colocara no peito, poucos dias antes; a citação elogiosa do General Mascarenhas; o retrato da filhinha, de olhos vivos e brilhantes como os do seu pai. Tudo agora muito desgarrado. “Este foi um dia triste para nosso Batalhão”, me disse o Major Manuel Rodrigues Carvalho Lisboa. “Nós Perdemos um BRAVO!!”

Fonte: Fatos e Homens da Segunda Guerra – Caio de Freitas, Joel Siveira, Mário Martins, R Magalhães Júnior e Zevi Ghivelder – editora Bloch

Sargento Wolf na sua última patrulha.

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  1. 20/05/2015 às 8:56 PM

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